Acho que o meu rabinho é o que mais assusta. Ouço as pessoas dizendo que não gostam de
mim, não porque eu tenho os olhos bem vermelhos ou porque eu cheiro tudo, mas alegam
que sou doente e que vou passar isso para elas.
Bem, confesso que não me lembro de ter estado doente. A maioria das vezes que as pessoas
entram na minha sala elas estão de branco, como médicos, mas não me dão remédios ou
coisas assim.
Eu tenho uma mãe. Quer dizer, ainda não sei se posso chamar ela de mãe. Sei que ela me
chama de Chico e gostaria de contribuir com um apelido carinhoso. Eu gosto que me chame de
Chico, acho um nome bem simpático.
Essa minha mãe é conhecida como Lorena e, não sei por que, está sempre me observando.
Todos os dias ela vem me visitar e é a hora que eu mais gosto. Ela está sempre com um objeto
na mão. Toda vez que vem me ver, ela me olha por um tempo e depois faz diversas anotações
nesse objeto.
Não sei o que Lorena escreve lá, gostaria que ela pudesse ler tudo para mim, mas, como não
fica muito tempo comigo, acho que as suas visitas não tem espaço para essas coisas de família.
Enfim...
Aqui onde moro existem mais ratinhos como eu. Por favor, não nos chame de ‘rato’, soa muito
malvado e nós não somos assim.
Ultimamente aconteceram umas coisas muito estranhas... Tem umas pessoas que entram
aqui, no lugar onde eu moro, e me observam de forma muito concentrada. Isso não chega a
ser um problema, claro... Afinal, minha mãe sempre está junto com elas.
Mas, são nesses momentos que acontecem algumas coisas esquisitas. Durante uma visita
dessas, acenderam uma luz dentro da minha casinha. Era uma luz normal, não chegava a me
incomodar muito.
Ocorre que no primeiro dia a luz acendeu e eu fiquei meio perdido. Não sabia bem ao certo
porque estavam acendendo aquela coisa... Mas depois que eles a apagaram, todos saíram da
sala e levaram minha comida!
Não sei se fiz algo de errado, ou se estou gordinho demais e preciso me controlar, mas sei que
fiquei com fome o resto do dia. Isso me deixou bastante chateado! Poxa vida, o que foi que eu
fiz afinal? Tudo bem que eu não estava com tanta fome assim, mas o fato da comida estar ali
me deixa mais tranquilo.
Só me lembro de que no outro dia aconteceu exatamente a mesma coisa. Lembrei também
que colocaram uma barrinha de ferro dentro da minha casa. O pessoal entrou na sala onde eu
fico (sei quando isso acontece porque a porta faz um barulhão, isso me incomoda um pouco) e
trouxe minha comida de novo. Fiquei bem feliz de ter minha comida de volta, pois a essa hora
eu já estava com fome. De repente, acenderam novamente aquela luz chata na minha cara! O
que eu ia fazer? Não consegui fazer nada durante todo o tempo em que o pessoal e a luz me
olhavam. E aí eles foram embora de novo levando a luz e a comida. Fiquei nervoso.
No outro dia o povo voltou e eu estava com uma fome danada. Quando eles acenderam a luz e
começaram anotar, aproveitei para subir na barrinha de ferro e comer tudo o que eu
conseguia, além de guardar um pouco na bochecha. Percebi que eles não paravam de anotar e
continuei comendo.
Depois disso, eles levaram a luz embora e a água também. Notei que isso acontecia sempre
nas terças e quartas-feiras. Então acabei percebendo que só teria minha água e comida de
volta enquanto a luz estava me iluminando. A partir daí nunca mais fiquei parado, a luz
acendia eu comia. Simples assim.
Eu sempre fico muito feliz quando a Lorena aparece, pois ela me pega no colo e me faz muitos
carinhos. Me apeguei muito a ela e adoro quando volta. Gosto de entrar no bolso da sua
blusa, é tão gostoso lá.
As mamães dos meus amigos também vêm visitá-los e sempre fazemos a maior festa enquanto
elas nos dão atenção. Quando elas vão embora ficamos muito sozinhos. Fazer o quê?
Ultimamente minha mãe tem vindo me ver cada vez menos. Eu sempre espero ansioso para
vê-la e receber seus carinhos, mas ela anda meio sumida.
Notei que alguns dos meus amigos andaram desaparecendo. Achei que eles tinham ido
passear e logo voltariam, mas nenhum deles voltou até agora... Vai ver o passeio está legal
demais e eles não querem voltar para casa.
Nas últimas semanas pouca gente tem entrado aqui e, quando entram, trazem água, comida e
vão embora. Não vi mais a minha mãe e sinto uma saudade imensa dela. Espero que ela volte
para me ver, pois não sei mesmo o que está havendo e poucos dos meus amigos ainda estão
aqui. Estou começando a ficar com medo de ficar sozinho. Peço, apenas, que se você ver
minha mãe Lorena por aí, diga a ela para vir correndo, pois tenho a estranha sensação de que
logo eu também vou sair para passear e não sei se volto.
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Chico - Aline Lima |
Aline Lima - Escolhas!
Texto lindo, triste e, infelizmente, verdadeiro!
ResponderExcluirParabéns, Aline!
Obrigada! Também acho triste essa realidade =/
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